ATA DA QUINTA SESSÃO SOLENE DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA SEGUNDA LEGISLATURA, EM 17.04.1997.

 


Aos dezessete dias do mês de abril do ano de mil novecentos e noventa e sete, reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezessete horas e trinta minutos, constatada a existência de "quorum", o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada a homenagear a Campanha da Fraternidade, conforme Requerimento nº 03/97 (Processo nº 29/97), de autoria da Vereadora Maria do Rosário. Compuseram a Mesa: o Vereador Clovis Ilgenfritz, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Sua Excelência Reverendíssima Dom Antônio do Carmo Cheuiche, Bispo Auxiliar de Porto Alegre; o Frei José Carlos Felisberto, representando o Prefeito Municipal Raul Pont; a Irmã Amália Viviam, representando a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Região Sul 03; o Irmão João Orestes Fagherazzi, Presidente Nacional da Pastoral Carcerária; o Senhor Oscar Santos, Coordenador da Equipe Técnica do Ensino Religioso na Rede Estadual de Ensino, representando a Secretaria de Educação do Estado; os Vereadores Guilherme Barbosa e Carlos Garcia, respectivamente, 2º e 3º Secretários da Casa; a Vereadora Maria do Rosário, proponente da Homenagem. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para ouvirem a interpretação das canções  "Candelária" e "América Livre", pelos Músicos Íris Escobar e Graciano Lorenzi, do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, e registrou as presenças, como extensão da Mesa, da Irmã Dione Santos Barreto, da Congregação das Irmãs Servas da Imaculada Conceição da Virgem Maria; da Professora Maria Norma Werlang, representando o Colégio Champagnat; do Professor Irmão Avelino Madalozzo, Coordenador do Grupo de Trabalho "Solidariedade", da Pontifícia Universidade Católica; do Senhor Eugênio Hansen, representando a "Renovação Cristã do Brasil"; do Senhor Paulo Roberto Richter; dos Senhores Cezar Corrêa e Paulo da Silva e Silva, representantes da Caixa Econômica Estadual/RS. Em prosseguimento, o Vereador Clovis Ilgenfritz, na Presidência dos trabalhos, informou que teria de se ausentar da presente Sessão para participar de ato público em curso no Largo Glênio Peres, passando a presidência dos trabalhos ao Vereador Guilherme Barbosa. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, assistirem à execução do Hino Nacional, e, dando continuidade, concedeu a palavra aos Vereadores que se manifestariam nesta solenidade. A Vereadora Maria do Rosário, como proponente e em nome das Bancadas do PDT e PPS,  elogiou o tema da Campanha da Fraternidade deste ano, tecendo considerações sobre os problemas enfrentados pelos encarcerados e seus familiares, problemas esses que refletem a sociedade na qual estão inseridos. O Vereador Eliseu Sabino, em nome da Bancada do PTB,  destacou a relevância humanitária da Campanha da Fraternidade, afirmando que o tema deste ano, os encarcerados, requer especial reflexão de todos os segmentos cristãos de nossa comunidade. O Vereador João Carlos Nedel, em nome da Bancada do PPB,  propugnou por uma análise profunda acerca das atitudes concretas que podem ser tomadas em benefício dos grupos mais excluídos da população. O Vereador Cláudio Sebenelo, em nome da Bancada do PSDB, classificou como desumano e desesperador o quadro hoje apresentado pelo sistema carcerário no País,  elogiando a escolha do tema dos encarcerados para a Campanha da Fraternidade deste ano. O Vereador Carlos Garcia, em nome da Bancada do PSB, discorrendo sobre a insalubridade das instalações carcerárias brasileiras, salientou a importância de se promover uma profunda reestruturação do sistema prisional no País. O Vereador Guilherme Barbosa, em nome da Bancada do PT, lembrando o temor dos cidadãos  frente à escalada da criminalidade, criticou o baixo índice de recuperação social dos encarcerados, ressaltando a necessidade de políticas governamentais para a alteração desse quadro. A seguir, o Senhor Presidente convidou os presentes a assistirem à execução da música-tema da Campanha da Fraternidade 1997, interpretada pelo Senhor José Guilherme Gotardo, representante da Associação da Educação Católica, e, após, concedeu a palavra ao Reverendíssimo Bispo Dom Antônio do Carmo Cheuiche, que agradeceu a presente homenagem.  Em prosseguimento, o Senhor Presidente convidou os presentes para, em pé, assistirem à execução do Hino Rio-Grandense. Às dezoito horas e trinta e oito minutos, o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores Clovis Ilgenfritz, Guilherme Barbosa e Carlos Garcia  e secretariados pelos Vereadores Guilherme Barbosa e Maria do Rosário, esta como Secretária "ad hoc". Do que eu, Carlos Garcia, 3º Secretário, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelos Senhores 1º Secretário e Presidente.

 

 

 


O SR. PRESIDENTE (Clovis Ilgenfritz): Estamos dando abertura à 5ª Sessão Solene desta XII Legislatura, uma Sessão solene dedicada a homenagear a Campanha da Fraternidade, que é fruto de um Requerimento nº 03/97 - Processo nº 29/97, de autoria da Vera. Maria do Rosário. É uma honra abrir esta Sessão e convidar a participarem da Mesa S. Exa. Revma. Dom Antônio do Carmo Cheuiche, Bispo Auxiliar de Porto Alegre; a representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - Região Sul III - Irmã Amália Vivian; o Presidente Nacional da Pastoral Carcerária Irmão João Orestes Fagherazzi e o representante da Secretaria de Educação do Estado Professor Oscar Santos, Coordenador da equipe técnica do ensino religioso na rede estadual de ensino.

Formada a Mesa, também registramos a presença dos Vereadores Eliseu Sabino,  Cláudio Sebenelo, João Nedel e Guilherme Barbosa. Posteriormente, registraremos outras autoridades presentes cujos nomes chegarão a esta Presidência.

Convido a todos para ouvirmos o Hino Nacional.

 

(Executa-se o Hino Nacional.)

 

O SR. PRESIDENTE: Registramos a presença do Ver. Gerson Almeida.

Convido os presentes para ouvirem agora a homenagem do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra à Campanha da Fraternidade 1997, com a participação dos músicos  do MST Iris Escobar e Graciano Lorenzi.

 

(Executa-se a música; a Srta. Iris Escobar canta as canções "Candelária" e “América Livre”.)

 

O SR. PRESIDENTE: Registramos, também, a presença do Ver. Carlos  Garcia e, conforme já havíamos prevenido à Vera.  Maria do Rosário e ao nosso querido Bispo Dom Cheuiche,  preciso retirar-me para o dito que está se realizando no Largo Glênio Peres. Sou convidado como Presidente da Câmara.

 Solicito ao 2º Secretário da Casa. Ver. Guilherme Barbosa, que assuma os trabalhos.

 Antes, passo a palavra à Vereadora proponente Maria do Rosário, que fala pelas Bancadas do PT, PDT e PPS.

 

A SRA. MARIA DO ROSÁRIO: (Saúda os convidados.) Quero,  nesta tarde, dizer a todos os Senhores e Senhoras da imensa alegria de realizarmos este momento especial de reflexão acerca do tema proposto pela Campanha da  Fraternidade deste ano de 1997. Para nós, o tempo da quaresma deve permanecer como reflexão em todos os dias deste ano de 1997. Vivemos um tempo em que as transformações são muito rápidas e muito profundas. A sociedade contemporânea convive  com um sistema mundial que se modifica a cada instante e neste sistema estão, definitivamente, colocados em xeque - por contradição absoluta - a maravilhosa capacidade humana de produzir novas tecnologias,  a maravilhosa e divina capacidade humana de produzir bem-estar, de produzir tecnologia e ciência em  todas as áreas em que a humanidade se coloca com disposição para tanto, com a contradição de milhares e milhares de pessoas vivendo em situação de pobreza extrema. Significativa parte da população vivendo  em situação de absoluto desespero. Vivemos sim,  um período de perplexidade, no mundo inteiro e no Brasil dos nossos dias.

Há um ano chorávamos todos nós, de mãos dadas, o assassinato bárbaro de 19 trabalhadores rurais, em Eldorado dos Carajás. Há pouco mais de um ano chorávamos a morte de crianças às portas da Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro. Não queremos que a estampa do nosso País - como disse a canção - seja a morte, a tristeza e a perda de seus filhos. Queremos um outro tipo de compreensão: a compreensão que produza um homem melhor, a partir da solidariedade, a partir da vida digna, a partir da certeza de que nós podemos - porque somos humanos - produzir uma sociedade plena de justiça, plena de alegria para todos os homens e mulheres. A perplexidade com que vivemos o nosso tempo deve gerar em nós não um momento de solidão, em que cada um vive individualmente essa situação de perplexidade, mas, ao contrário, a perplexidade de um primeiro momento deve se transformar em força mobilizadora, deve se transformar mesmo em trabalho, um trabalho voluntário, um trabalho mais do que digno, um trabalho dedicado, um trabalho consciente, um trabalho decisivo para modificarmos essa realidade que embrutece todos nós. Precisamos, sim, nos libertar! Precisamos libertar todos! Precisamos nos libertar das prisões que nos mantêm. E, corajosamente, neste ano de 1997, a CNBB nos propôs e nos chamou, como sociedade, e também como Vereadores, como representantes do Município de Porto Alegre, a refletir sobre a fraternidade e os encarcerados, sobre homens e mulheres esquecidos, depositados em algum lugar, em celas, varridos para onde não lhes podemos ver, durante todo o tempo, pelo menos. Mas sentimos a sua presença sempre pela violência;  raramente pela fraternidade e pela paz. Sentimos as suas presenças nos motins, nos momentos de maior dor e raramente pelo trabalho constituído pela recuperação de cada um daqueles cidadãos.

Quem são esses que estão encarcerados? E não estamos nós também encarcerados pela ausência de políticas, de propostas, de projetos para uma sociedade mais livre? Os encarcerados que superlotam  as prisões brasileiras,  na maior parte  são oriundos das camadas populares,  são filhos das camadas sociais menos favorecidas, que têm baixa escolaridade. Vejam que 43% são negros; 85% não podem pagar sequer um advogado, necessitam do Poder Judiciário estatal e da Justiça gratuita; 95% estão abaixo da linha de pobreza. Como vivem suas famílias? Como vivem essas pessoas? Temos uma população carcerária de mais de 124 mil pessoas, quando a capacidade do nosso sistema prisional não estaria além dos 54 mil encarcerados. Em média,  temos  mais  do que dois presos para cada vaga dentro do sistema prisional.

O que precisamos fazer para o resgate da humanidade?  Desses  que estão dentro de uma penitenciária e, por conseqüência, da humanidade de nós todos que vivemos em uma grande penitenciária: a penitenciária da fome, da exclusão social, da violência, do medo, do medo da violência? Esse medo é promovido, como vimos há poucos dias, muitas vezes pela própria ação policial, mas é promovido,  também,  por tantas e tantos que não conseguem resgatar uma outra possibilidade de vida, o que temos a obrigação de fazer com que exista,  com emergência absoluta, sob pena de todos nós sermos prisioneiros de uma sociedade que constituímos para a desigualdade e não para o amor.

Como se pode gestar a esperança  de uma nova vida, de uma nova possibilidade, como se pode pensar no futuro que é o momento no qual passaremos o resto de nossas vidas, quando precisamos conviver com tantos e tantos outros abarrotados dentro de uma única cela? Que tipo de proposta o nosso sistema prisional tem no sentido do resgate da humanidade e de devolver, sim, à sociedade homens e mulheres que sejam melhores, que não cometam mais os crimes que cometeram?

Na verdade, a Campanha da Fraternidade, neste ano, toca em temas muito duros para nós todos. Quero dizer, como proponente desta Sessão - o que muito me honra ser, "inclusive fui acolhida pelo conjunto da Casa -, que o grande desafio que nós temos é o de pensarmos numa nova Justiça.  Numa Justiça que não trabalhe apenas com a prisão como uma punição à liberdade, porque em conjunto com a prisão e a  falta de liberdade nos nossos dias, dentro do nosso sistema carcerário, são encontrados os maus tratos, a incerteza sobre a vida das famílias, a AIDS, as violações e toda a sorte de doenças e males que ali se gestam. Precisamos de uma solidariedade superior, e a Campanha da Fraternidade nos disse: "Abracemos as vítimas, abracemos a cada um que é vítima, abracemos a cada família que tem no seu seio alguém que tenha sido vítima dos maus tratos desta sociedade".

Digamos que é  preciso constituir uma sociedade superior e não é pelo sistema da pena de morte, tão propagada, e pelo sistema do ataque pessoal que nós conseguiremos reverter os males que temos nos dias de hoje. A pena de morte já existe para tantos neste País, e não resolvemos,  por ela, os males da violência urbana e rural". A Campanha da Fraternidade nos diz que precisamos apoiar as famílias, que precisamos pensar nas famílias dos encarcerados, pensar como vivem as meninas e meninos, filhos daqueles que estão encarcerados e que precisam ter alguma proposta de vida melhor; alguma proposta que dignifique a sua possibilidade de um futuro e presente com liberdade, diferente da trajetória que seus pais estão vivendo no dia de hoje.  Precisamos constituir essas esperança como proposta real no seio da nossa sociedade.

Por fim, a Campanha da Fraternidade chamou-nos a atenção de que precisamos ser solidários e precisamos defender os direitos fundamentais daqueles que estão encarcerados para que a sociedade seja mais justa e humana e para que, de fato, exista uma justiça social superior à dos nossos dias e que não precisemos mais conviver com a violência de Eldorado dos Carajás,  com a violência da Candelária e com a violência dos nossos dias. Nós precisamos sair de uma atitude contemplativa e partirmos para a ação e faz parte disso a defesa de uma sociedade mais justa,  mais humana e que consiga trabalhar de um modo superior com essa ampla contradição, especialmente no sentido de superá-la e de afirmar uma sociedade melhor.

Muito obrigada, e,  para finalizar, gostaria de ler esse Salmo que moveu essa nossa solicitação, que diz: "Deus adverte às autoridades - e quero me sentir advertida por esse Salmo -; Deus se levanta ao Conselho Divino e,  em meios aos deuses,  ele julga: "Até quando vocês julgarão injustamente,  sustentando a causa dos injustos? Protejam o fraco e o órfão; façam justiça ao pobre e ao necessitado;  libertem o fraco e o indigente e os livrem das mãos dos injustos".  Que assim seja. Obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE (Guilherme Barbosa): Queremos  corrigir uma falha nossa e convidar o Frei José Carlos Felisberto,  que representa o Sr. Prefeito Municipal, a fazer parte da mesa.

Também comunicamos as presenças - e consideramos em nossa mesa à Irmã Dione Santos Barreto, da Congregação das Irmãs Servas da Imaculada Conceição da Virgem Maria; da Professora Maria Norma Werlang,  representando o Colégio Champagnat; do Professor Irmão Avelino Madalozzo, Coordenador do Grupo de Trabalho Solidariedade, da Pontifícia Universidade Católica; do Senhor Eugênio Hansen, representante da Renovação Cristã do Brasil; do Senhor Paulo Roberto Richter; de Paulo da Silva e Silva, Cezar Corrêa Torres, representantes da Caixa Econômica Estadual e mais outros tantos presentes.

Em seguida, usará da palavra o Ver. Eliseu Sabino.

 

O SR. PRESIDENTE: O Ver. Eliseu Sabino está com a palavra.

 

O SR. ELISEU SABINO: Excelentíssimo Sr. Presidente; Sua Excelência, Reverendíssimo Dom Antônio do Carmo Cheuiche, Bispo Auxiliar de Porto Alegre; Representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - Região Sul 3, Irmã Amália Viviam; Presidente Nacional da Pastoral Carcerária,  Irmão João  Fagherazzi: Representante da Secretaria de Educação do Estado, Prof. Oscar Santos, Coordenador da Equipe Técnica de Ensino Religioso na Rede Estadual de Ensino; Exmo. Representante do Sr. Prefeito Municipal, Frei José Carlos Felisberto;  Irmã  Diones Santos Barreto,  Srs. Vereadores e demais  participantes desta cerimônia, os nossos sinceros cumprimentos e a nossa manifestação de carinho e apreço a todos.

Inicialmente, trago aqui a minha palavra de parabenização à Vera. Maria do Rosário,  proponente desta Sessão, que,  num momento de significativa importância,  nos trouxe esta maravilhosa oportunidade. Em nome do Partido Trabalhista Brasileiro, do qual faço parte, também em nome, talvez para perplexidade de alguns, da Igreja Evangélica Assembléia de Deus, da qual este Vereador é Pastor, estamos aqui participando desta solenidade pela Campanha da Fraternidade. Vimos aqui trazer algum pensamento no que diz respeito a esta importante iniciativa da qual,  particularmente, nos sentimos honrados, porque fazemos parte de um contexto social e religioso, especificamente de nossa Cidade, de nosso Estado e da nossa Nação.

A Campanha da Fraternidade deste ano não se difere das demais, mas propõe a um ponto concreto,  no qual todos nós, cristãos, estamos empenhando nossas forças, a fim de nos organizarmos em termos conjuntos; a fim de darmos testemunho da comunhão, através de um espírito e de um serviço especial. A Campanha da Fraternidade de 1997 tem como tema palpitante: "Cristo liberta de todas as prisões: Cristo disse: “Estive preso e não me visitastes; tive fome e não me destes de comer”. Pelas grades de todos os tipos de prisões quer penetrar a luz de Cristo. Ele conta com cada um de nós.

Rumo ao terceiro milênio, direcionamos nossa vida para o grande centro que é Jesus Cristo, vivendo a fé. É tempo de sair do túmulo, das acomodações, da prisão do egoísmo, das amarras dos falsos laços e compromissos. É Cristo que nos chama ao amor, o mesmo Cristo que nos liberta pelo amor, através do caminho da cruz, em obediência a Deus, Pai.  Cruz, que para nós é sinal de vida e é sinal de ressurreição. A fraternidade e os encarcerados  são tema da Campanha da Fraternidade. Diante da realidade das penitenciárias, dos presos e dos seus familiares, dos processos tantas vezes retardados e injustos, das situações de impunidade e desigualdade perante a lei, voltamos o nosso olhar para Cristo, o Cristo que é homem do sofrimento, experimentado na dor. Jesus era desprezado e não fazia caso do desprezo. A sociedade discrimina, adula, faz falsas propostas, depois isola, afasta, esquece os seus, atrás das grades de todos os tipos de prisões. Fazemos nós caso daqueles presos e presas humilhados, deixados no esquecimento da lei? E das vítimas de todo o tipo de violência nesse imenso mar de sofrimento?

Jesus Cristo quer a todos alcançar com os nossos braços. Fazemos nós caso da queixa de Jesus, que diz: "Estive preso e não me visitastes"? São muitos os tipos de prisão. Poderíamos enumerar muitos tipos de prisioneiros e muitos tipos de prisões. Há prisioneiros dentro e fora dos cárceres. Jesus é quem liberta de todas as prisões. Ele é o Redentor do homem.

Concluo o meu pronunciamento, usando a expressão de Jesus no Evangelho de João, capítulo 8, versículo 32: "E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará". Essa é a realidade: quando conhecemos a Cristo, temos a verdadeira liberdade. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: O Ver. João Carlos Nedel está com a palavra. Fala pelo PPB.

 

O SR. JOÃO CARLOS NEDEL: Sr. Presidente. (Saúda os componentes da Mesa.) Senhoras e Senhores, a Campanha da Fraternidade,  iniciativa da CNBB, durante a Quaresma,  convoca  os católicos à reflexão e a reconverterem-se para Cristo, e, ao mesmo tempo, convida os não-católicos a aproximarem-se de Cristo, vivendo uma fraternidade ampla, dentro da visão de que todos somos filhos de Deus. O primeiro e principal objetivo, portanto, da Campanha da Fraternidade, é voltar-se para o Criador, é aumentar a nossa espiritualidade. A partir daí,  apresenta pistas de ações concretas para a prática da caridade. Dentro desse contexto apresenta o grande tema deste ano, que é a fraternidade e os encarcerados, e como lema "Cristo liberta de todas as prisões!"

Realmente, Senhoras e Senhores, são muitas as prisões que nos oprimem e das quais Cristo nos liberta através do perdão dos nossos pecados. Por isso, a Igreja se posiciona frente a todas as cadeias e prisões, que oprimem e nos causam sofrimento: a doença, a miséria, a pobreza, a falta de esperança, a deturpação da sexualidade, o egoísmo, a avareza, a mentira, a injustiça, a corrupção, o desrespeito à vida, as práticas e os preconceitos étnicos.

Por isso, também convido a todos a uma reflexão, a uma profunda reflexão e, especificamente, aqui, na Câmara de Vereadores de Porto Alegre: quais são as nossas prisões e cadeias? Será que nós, Vereadores - essa é uma reflexão a que os convido -, não estamos sendo causa de prisões ou cadeias para a nossa população, para os nossos eleitores, para os contribuintes municipais? E a nossa ação concreta da Campanha da Fraternidade - fomos visitar o encarcerado? Contribuímos financeiramente para o gesto concreto da Campanha da Fraternidade? Saibam, Senhoras e Senhores, que a Pastoral carcerária está pedindo doações de roupas, de materiais de higiene pessoal, de papéis, envelopes, selos e material para uma boa leitura. Essas doações podem ser entregues no centro da Pastoral e,  tenho certeza, no gabinete de cada Vereador. Que bom que Cristo nos dá oportunidades para a prática da caridade, abrindo caminho para a nossa salvação. Gostaria de ler a oração da Campanha da Fraternidade, que sirva também como uma oração:

“Pai, aceitai nosso louvor

por vossa infinita clemência e misericórdia.

Confiantes, vos pedimos:

dai-nos coração novo,

capaz de amar; de perdoar!

 

Vosso Filho bendito e nosso irmão Jesus

esteve preso, foi torturado e morto,

mas ressuscitou para nos dar vida.

Ele nos liberta de todas as prisões!

 

Olhai para nossos irmãos encarcerados,

para suas famílias!

Enxugai as lágrimas, sarai as feridas

das inúmeras vítimas das violências!

 

Livrai-nos de todo sentimento de ódio

e de vingança.

Envolvei-nos em vossa misericórdia

e transformai tantas mortes, sofrimentos,

em semeadura de vida nova,

de vida fraterna para todos!

Nós vos pedimos por Jesus Ressuscitado,

no amor do Espírito Santo. Amém”.

(Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)   

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Cláudio Sebenelo.

 

O SR. CLÁUDIO SEBENELO: Senhor Presidente e Senhores Vereadores. Os presídios,  em todas  as cidades do mundo, ficam muito longe dos centros urbanos, os hospitais, os hospícios, os sanatórios. Nós não conseguimos conviver com as nossas mazelas, ou nós colocamos para debaixo do tapete, ou colocamos bem longe, assim como os hospitais de tuberculose em Porto Alegre se situavam lá em Belém Velho, lá no fim da linha do Partenon. Os nossos presídios ficavam no extremo, fora da Cidade, ali no Gasômetro, quando a Cidade cresceu empurrou para a Chácara das Bananeiras. Eu freqüento os presídios  por um motivo muito diferente daquele que uma pessoa com o coração aberto possa  visitar um prisioneiro: a minha formação em Sociologia fez com que eu freqüentasse o presídio de Charqueadas, a penitenciária de Jacuí, de segurança máxima, a chamada "Penitenciária Pato Donald". Freqüentando a Penitenciária Industrial, onde fiz estágio, lá fui testemunha do horror da droga, do homossexualismo forçado,  da promiscuidade, da vadiagem, do horror da desesperança, da paralisação da vida.

 Cristo nos liberta de todas as prisões,  mas que prisões são  essas? Prisões da violência,  da miséria, da doença, do analfabetismo, da droga, da  indiferença, das nossas próprias amarras, das nossas limitações.

Para minha agradável surpresa,  não surpresa  no sentido de que não pudesse esperar, mas de uma lembrança tão terna, tão humana, a Campanha Fraternidade escolheu -  talvez  o reduto menos poderoso da sociedade -  o mais simples, o que perdeu todos os direitos, o que não tem direito a um emprego e ao trabalho, não só dentro da prisão, mas quando sair dela também não vai ter direito. Ele é preconceituosamente carimbado como um ex-presidiário. Apenas 5% daqueles que vão para as nossas prisões são recuperados, voltam à sociedade e a ela se reintegram. Outros voltam desgraçadamente para as prisões, ou para o túmulo da banalização da vida, da desimportância do ser humano e da indiferença à dor dos outros.

Talvez um dos episódios mais importantes deste século foi a visita do Papa a Ali Hagka. Ele foi à prisão, não por uma formalidade, não por uma coisa ostensiva para aparecer na imprensa, mas para perdoar aquele que estava condenado a viver como se fosse um parricida, ou um regicida e, certamente,  na Idade Média a pena dele seria um suplício.

Hoje, a Justiça não invade mais o corpo, mas a alma das pessoas que vivem a lhes dizer que somos prisioneiros desses imensos portões de ferro da nossa insensibilidade, da nossa indiferença com os nossos irmãos, com o nosso próximo. Penso que a humanidade precisa, cada vez mais, exercitar a sua humildade,  pois a Bíblia nos ensina que quem se humilha será exaltado  e quem se exalta será humilhado, como humilhado foi o fariseu e como exaltado foi o publicano. Candelária, Candelária, estampa do Brasil, vergonha do Brasil.

 Vera. Maria do Rosário, muito obrigado por esta oportunidade. (Saúda os componentes da Mesa.) A liberdade dos nossos cárceres só será atingida através do amor. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Usará a tribuna o Ver. Carlos Garcia, do PSDB.

 

O SR. CARLOS GARCIA: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Gostaríamos, em primeiro lugar, de saudar a companheira  Vera. Maria do Rosário pela sua iniciativa.  É importante saber que aqui é a Casa do Povo e a Casa do Povo é a casa de Deus. Falar sobre Campanha da Fraternidade é algo que a Igreja já faz há 30 anos, e sempre no período da Quaresma. É o momento em que todos nós, cristãos, devemos parar, refletir e meditar, pois é um período do ano litúrgico para nós avaliarmos as nossas ações do dia a dia, fazermos uma ampla reflexão e, ao mesmo tempo também, evangelizar,  pois  essa é uma missão de todos nós. A CNBB,  quando iniciou, em 1967, a  Campanha da Fraternidade,  não poderia  ter sido mais feliz. A cada ano ela traz um novo assunto palpitante e polêmico. No início,  muitos até se escandalizavam, diziam que a Igreja não deveria abordar tais temas. Mas não,  volto a enfatizar: a Igreja é a casa de todos, como aqui é a casa de Deus. Deus e povo estão sempre junto, então os assuntos têm que ser sempre discutidos, sim, D. Antônio Cheuiche. E o senhor sabe, é daqueles que, em todos os momentos, sempre discutiu - e discutiu muito bem -, porque sempre teve ousadia e coragem e levou sempre a sua palavra.

Este ano a campanha da Fraternidade teve como tema os encarcerados e, como lema, "Cristo liberta de todas as prisões". Todos nós somos prisioneiros; prisioneiros de inúmeras situações que os demais Vereadores que me antecederam levantaram. Prisioneiros, às vezes, da nossa própria consciência, que é, talvez, a maior prisão.

Felizmente, há os que acreditam, e eu acredito e digo sempre: que bom que Cristo liberta e sempre nos oportuniza.

Desta forma, a Campanha da Fraternidade retoma a promoção dos direitos civis que estão inseridos no projeto rumo ao novo milênio. Tenho certeza de que no próximo ano um outro tema vai ser amplamente discutido para uma reflexão de toda a sociedade.

A questão das prisões e presos, no Brasil, é um dos maiores problemas que enfrenta a nossa sociedade. O problema dos encarcerados, e tudo quanto a eles está relacionado, sem mudanças profundas no sistema carcerário torna-se quase impossível de resolver.

Eu, como sou da educação, acredito que o sistema penitenciário tem que passar,  primeiro,  por uma  educação a educação do nosso povo. Eu quero, também, sair da prisão, mas quero sair e viver uma utopia,  D. Antônio: a utopia de ver um dia o nosso povo ter direito à moradia, ao trabalho, à educação -  e,  por que não? -, direito ao lazer, a viver, desculpem, à vagabundagem de sonhar, a parar e ter o direito de sonhar. Muito obrigado à Igreja por proporcionar a cada ano um novo tema para a nossa reflexão. Vera. Maria do Rosário, parabéns, mais uma vez, pela sua iniciativa. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Solicito ao Ver. Carlos Garcia que assuma a Presidência dos trabalhos para que este Vereador possa fazer uso da palavra em nome da Bancada do PT.

 

O SR. GUILHERME BARBOSA: (Saúda os componentes da Mesa.) Nas nossas cadeias,  com  certeza vamos encontrar algumas pessoas que talvez tenham de fato a índole da maldade, mas,  com  certeza, a maior parte das pessoas  apenas em algum momento da sua vida cometeu um erro,  um desatino, não raro  em momentos de forte emoção. As nossas cadeias não tratam de recuperar o ser humano que por alguma razão chega lá, mesmo que seja intrinsecamente mau, que é com certeza, a minoria. As nossas cadeias são, na verdade, uma degradação do ser humano, não recuperam as pessoas que, em um mau momento de sua vida,  precisariam ser acolhidas. As cadeias não trabalham com os presos dando uma qualificação profissional, como já mostrou a estatística referida pela Vera. Maria do Rosário, eles não têm acesso a essa possibilidade. A grande maioria é pobre, muito pobre. Então, é preciso que haja uma política diferenciada para que nós, de fato, recuperemos os presos e não os transformemos em seres humanos de segunda categoria. Às vezes, ensinamos a eles, aí sim, a profissão do crime.

No entanto, a nossa sociedade criou outras cadeias e outras grades. Hoje, a maior parte da população vive numa cadeia dentro de suas casas para se proteger da violência das ruas e, em algumas cidades do Brasil, infelizmente, a violência, às vezes, vem da polícia. Felizmente, no Rio Grande do Sul estamos livres disso. Vamos torcer para que permaneça assim. E há a cadeia da ignorância, dos que não tiveram acesso à escola; há a cadeia da fome, daqueles que não têm acesso ao alimento; há a cadeia do desemprego, dos que não possuem trabalho; há a cadeia da doença, dos que não têm acesso à saúde; há a cadeia dos sem terra - uma grande coincidência dessa Sessão - que vivem sob uma lona preta, à beira da estrada, quando ao lado há um grande latifúndio, somente com capim e grilo, e nós também gostamos, mas terra é para produzir.                             

O nosso Partido, o PT, luta - assim como alguns outros - para modificar essa situação,  para modificar essa realidade. O Brasil é um país como poucos no mundo, pelo seu potencial, pela sua terra agricultável, pelas suas riquezas minerais,  pelo seu litoral piscoso,  pela sua geografia de poucos desastres climáticos. Então, o nosso povo poderia, com certeza,  ter  uma situação de vida invejável. E é por isso que nós lutamos. Mas nós queremos,  por outro lado, que permaneçam algumas grades que são benditas, de algumas prisões benditas, que são as grades da solidariedade e as grades da fraternidade.

Parabéns à CNBB pela coragem do tema. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Carlos Garcia): Agora, ouviremos a apresentação do representante da Associação da Educação Católica, o Sr. José Guilherme Gotardo com a música-tema da Campanha da Fraternidade 1997.

 

 (É executada a música.)

 

 O SR. PRESIDENTE (Guilherme Barbosa): Registramos a presença do Ver. Adeli Sell.

 Passamos a palavra ao Dom Antônio Cheuiche, que fala em nome dos homenageados.

 

O SR. ANTÔNIO CHEUICHE: Exmo. Sr. Presidente, Srs. Vereadores, autoridades aqui presentes e meus amados irmãos e irmãs em nosso Senhor Jesus Cristo. Apenas uma palavra de gratidão à minha grande amiga Vera. Maria do Rosário pela sua iniciativa, eu a ouvi com muita satisfação.

Quero deixar aqui duas experiências: fui procurado, certa feita, por um grupo de senhores que vinham me pedir um apoio, era a Associação dos ex-Encarcerados. Eu não sabia que existia essa Associação, quer dizer, uma sociedade que é capaz de colar um rótulo, quando o nosso Senhor nos perdoa a todos e foi a sua última palavra na cruz, é um desafio para nós. Uma vez, quando eu era responsável por aquela parte na Arquidiocese, visitei  três vezes -  longamente - o cárcere central, e um preso me disse: "Seu Bispo, o meu destino é cadeia" - eu fiquei surpreso -, “porque eu tive”, explicou ele, “a desgraça de roubar uma vez, vim, saí com a vontade de nunca mais incidir, mas tive que roubar pela  segunda vez,  porque ninguém quis me dar emprego”. Lembrei-me daquela frase de um grande prisioneiro que se chamou Dostoievski, na Casa dos Mortos, quatro anos na prisão da Sibéria, no século passado, quando ele disse: "Todos nós somos criminosos quando não sabemos levar o perdão e não acreditamos na possibilidade de recuperação, porque o cárcere, em  vez de ser um espaço de recuperação,  é uma espécie de universidade do crime, infelizmente."

 Outro fato que eu gostaria de recordar é que o cárcere precisa de compreensão e de ternura. Há uns 15 anos,  eu fui fazer a crisma no cárcere: quarenta e dois crismandos,  presos, a maior parte jovens - rapazes de 21 a 30 anos. Ao final da cerimônia, me pediram uma fotografia. Eu disse: “Vamos fazer um grupo, e eu tiro com vocês a fotografia.” “Não, Sr. Bispo,  nós queremos um por um”. “Quarenta e dois ‘flashes’”? “É”. “Por que vocês querem ser fotografados um por um?” Um deles me respondeu: “Nós queremos ser fotografados sozinhos,  um por um,  porque nós  queremos mandar essa fotografia para a mãe, e a mãe vai chorar”. Lembrei-me, então, da frase do Cardeal Vicente nas suas memórias publicadas em 1979: “No tempo em que estive no cárcere, só a minha mãe me visitou. A mãe é essa pessoa que é capaz de chegar ao fundo do poço, do calabouço". Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convido a todos a ouvirmos o Hino Rio-Grandense.

(Ouve-se a execução do Hino Rio-Grandense)

 

Agradecemos a presença de todos e declaramos encerrada a presente Sessão.

 

(Encerra-se a Sessão às 18h38min.)

 

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